quarta-feira, fevereiro 08, 2006

Uma questão de conceitos.

"Liberdade". Que palavra tão bela. Muitos gritaram liberdade ou morte, com a certeza que com a morte se libertariam. Muitos lutaram por ela escondidos na sua clandestinidade. Outros, num exílio forçado. Liberdade, a maior dádiva da Revolução de Abril. Liberdade, essa benção divina, que ninguém, nenhum estado, política ou homem nos pode retirar.
O que se esquece, por vezes,é que a liberdade é uma flor preciosa, tão preciosa como a vida. E que por isso, merece ser regada, respeitada e preservada. Que implica responsabilidade. A responsabilidade de zelara pela liberdade do nosso vizinho.
Mas muitos a tomam como certa, dum modo egoísta e arrogante. Esquecem-se que cada ser humano tem a sua, e que a violentação dela, com a nossa como pretexto, é um perigoso eucalipto que seca tudo à volta.
Daí, em prol da nossa liberdade e democracia, se bombardeiem vilas inteiras, civis inocentes. Tudo pela prevenção...
E à custa da liberdade de pensamentos dos outros, se brinca aos desenhos. Tudo pela "liberdade de expressão".
Liberdade implica liberdade de expressão. Disso não há que haver dúvidas. Com uma vem a outra. Mas, vejamos o seguinte exemplo, tão comum no nosso dia-a-dia.
Há pessoas que têm uma frase típica, que gostam de usar à boca cheia: "O que tenho para dizer, não o mando dizer por ninguém". Ou pior: "o que eu penso digo logo". Pois é... só que estas pessoas esquecem-se, que do outro lado poderá estar uma pessoa que não quer ouvir, que não deu autorização para ser alvo de opinação, e que também tem esse direito.
E isso, meus amigos, é uma violação da privacidade e da liberdade do próximo. É quando achamos que o Universo gira em torno do nosso umbigo, e que o mudo tem de parar para ouvir-nos dizer o que nos vem à cabeça, porque "a mim ninguém me cala".
E, pelo nosso direito à liberdade de expressão, pisamos a liberdade do outro. Isso não é liberdade. É desvirtuar o conceito maravilhoso de liberdade. Por isso, também o verdadeiro conceito de anarquia, foi violentado por aqueles que pensam que destruir, partir é anárquico. E que anarquia = caos. A base da verdadeira anarquia é o respeito "religioso" da liberdade do próximo. Só assim as pessoas poderiam viver em paz umas com as outras.
Mas enfim. A história dos cartoons nos países nórdicos vem demonstrar que esse respeito é utópico.
A liberdade de expressão não é mais importante que a liberdade religiosa do próximo, mesmo que este esteja a milhares de km de distância. Aliás, desde há muito, que vivemos numa aldeia global. E brincar com a religião de milhões de pessoas só porque nos apetece é duma enorme infantilidade cívica. É a postura de indivíduos mentalmente adolescentes... Mas claro, tudo pela liberdade de expressão.
E depois há a questão do bom gosto.
Tenho visto cartoons maravilhosos, cheios de humor com Jesus Cristo como personagem central. Mas o cartoon em que Maomé surge com uma bomba na cabeça é de um gosto duvidoso, mesmo ofensivo, tendo ainda em conta o momentos periclitante que se vive a nível mundial.
É, no fundo, uma questão de bom-senso.
E uma questão de desvirtuamento conceptual.
A democracia, e a liberdade a ela inerente, tem também uma lógica maravilhosa: "tu tens o direito de dizer mal de mim. E por esse direito darei a minha vida, se for caso disso". O problema é quando o outro nos diz: "óptimo".
O cartoonista tem o direito de desenhar o que quiser. O problema é quando ele usa esse direito para ofender gratuitamente alguém.
Liberdade e Democracia. Que conceitos tão belos. Tesouros cheios de pedras preciosas. Mas constantemente assaltados por saqueadores.

1 Comments:

Anonymous Anónimo said...

Amigo, puseste o dedo na ferida, tens que te dedicar mais a isto, tu escreves muito bem.

12:45 da tarde  

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